Um “coquetel explosivo”. Foi desta forma que a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) classificou o que pode representar o período após o Carnaval 2016 para o País. Segundo a entidade, existe chance considerável de aumento no número de infectados pelo Zika Vírus e, como consequência, elevação nos registros de novos casos de microcefalia.
A doença neurológica vem sendo relacionada à presença do Zika Vírus em determinadas gestantes, que podem transmitir o vírus para os bebês por meio da placenta. Até a terceira semana de janeiro, existiam 3.530 casos de microcefalia relacionados ao Zika em 21 estados. O Carnaval é considerado um agravante devido à passagem de milhares de turistas por capitais com festas de rua e que registram epidemias da doença, além da festa favorecer o uso de pouca roupa e uma consequente exposição maior à picada do mosquito Aedes aegypti, que transmite, além do Zika, Chikungunya e Dengue.
Também será um período possivelmente mais chuvoso, devido à época do ano, com maior quantidade de lixo nas ruas e com mais chance de surgimento de novos potenciais criadouros do mosquito. Ainda é considerado um agravante, o aumento no número de relações sexuais sem proteção, pela incerteza da transmissão do vírus nestes casos. Por isso, é preciso um cuidado ainda maior no combate ao mosquito e no uso de repelentes nestes dias, sempre com orientação médica.
Para evitar que a doença se alastre, governos e população precisam agir. Confira entrevista com a médica infectologista Anna Karenine Braúna, profissional dos Centros Médicos Promédica, que dá detalhes sobre as doenças e explica de que forma, de fato, é possível existir a prevenção.
Na Bahia, e em outras partes do País, são recorrentes epidemias de Dengue. Nos últimos anos, a população passou a enfrentar, também, epidemias de Chikungunya e Zika Vírus, doenças transmitidas pelo mesmo mosquito (Aedes aegypti). Estes vírus são novos no Brasil?
Sim. Os virus da Chikungunya e da Zika foram introduzidos no País nos últimos dois anos.
– Por que começaram a aparecer com mais frequência?
O fato de a população ser susceptível aos dois vírus e a presença do vetor (mosquito) em todo o Brasil facilitaram a disseminação das duas doenças, além da Dengue.
– Existe algum período do ano que favoreça a proliferação do mosquito?
A proliferação depende de condições climáticas específicas de temperatura, precipitação (chuva) e umidade, que são essenciais para a sobrevivência, reprodução e desenvolvimento do Aedes aegypti. Temperaturas altas reduzem o tempo necessário para o vírus se replicar e se disseminar no vetor (mosquito), permitindo que ele alcance o estado infectante mais rápido.
O intervalo de temperatura entre 25ºC e 30ºC é considerado, particularmente, favorável ao desenvolvimento da larva. Como o surgimento dos ovos depende do contato com água, a chuva é, também, uma importante aliada do Aedes aegypti. Desta forma, para a proliferação, deve haver chuva de forma não contínua ou algum tipo de produção de água parada. Se chove pouco, o nível da água não sobe nos recipientes, evitando que os ovos eclodam. Se chove muito, os criadouros podem ser destruídos pela força da água. A alta umidade do ar também colabora para manter os ovos viáveis fora d’água.
Devido à sua forte dependência do clima, a população de Aedes aegypti e, consequentemente, a transmissão da dengue apresentam forte sazonalidade. Épocas mais quentes e chuvosas do ano costumam ser marcadas por um grande aumento no número de casos registrados da doença, coincidindo com o verão na maioria dos estados brasileiros.
– Fale um pouco sobre os diferentes sintomas que cada uma das doenças apresenta.
A Dengue pode causar febre, mialgia (dor muscular), artralgia (dores nas articulações), dor retroorbitária (ao redor dos olhos), leucopenia (diminuição da taxa de leucócitos), plaquetopenia (diminuição do número de plaquetas no sangue) e sangramentos.
A pessoa com o vírus da Chikungunya pode apresentar febre, mialgia, artralgias intensas e edemas. Já o Zika Vírus, causa rash cutâneo (erupções ou manchas na pele), edemas e hiperemia conjuntival (olhos avermelhados).
– O que fazer caso a pessoa comece a apresentar estes sintomas?
Deve procurar assistência medica para esclarecer qual das viroses está apresentando, para que se tome as medidas necessárias.
– Diante dos números de pessoas infectadas, temos um caso de saúde pública. Como acontece a prevenção por parte dos governos?
O governo é responsável, junto com a população, no controle destas doenças, principalmente nas medidas preventivas e de combate ao mosquito vetor, além do tratamento clínico destas infecções.
– De que forma a população pode colaborar de maneira mais efetiva?
A população deve fazer sua parte controlando, no seu domicílio, os prováveis criadouros do mosquito, evitando acúmulo de água parada. É importante não acumular água em latas, embalagens, copos plásticos, tampinhas de refrigerantes, pneus velhos, vasinhos de plantas, jarros de flores, garrafas, caixas d´água, tambores, latões, cisternas, sacos plásticos e lixeiras, entre outros.
– Neste último ano, o Ministério da Saúde começou a correlacionar a infecção pelo Zika Vírus com o aumento no número de quadros de microcefalia. Existe algum novo estudo já divulgado que fundamente esta relação?
As malformações congênitas, dentre elas a microcefalia, têm origens complexas, por conta de muitos fatores e podem ocorrer em decorrência de processos infecciosos durante a gestação. As evidências disponíveis até o momento indicam fortemente que o vírus Zika está relacionado à ocorrência de microcefalias. No entanto, não há como afirmar que a presença do vírus Zika durante a gestação leva, inevitavelmente, ao desenvolvimento de microcefalia no feto.
A exemplo de outras infecções congênitas, o desenvolvimento dessas anomalias depende de diferentes fatores, que podem estar relacionados à carga viral, fatores do hospedeiro, momento da infecção ou presença de outros fatores e condições que são desconhecidos até o momento. Por isso, é fundamental continuar os estudos para descrever melhor a história natural dessa doença.
– Quais precauções devem ser adotadas pelas mulheres grávidas?
Proteger-se ao máximo das picadas de insetos durante a gestação. Evitar lugares onde há presença de mosquitos, utilizar roupas que protejam partes expostas do corpo e
consultar o médico sobre o uso de repelentes, além de verificar, atentamente, no rótulo, as orientações quanto à concentração e frequência de uso recomendada para gestantes.
É importante permanecer, principalmente no período entre o anoitecer e o amanhecer, em locais com barreiras para entrada de insetos, como telas de proteção, mosquiteiros, ar condicionado ou outras disponíveis.
– É necessário evitar uma nova gestação? Até quando?
É muito complicado afirmar que as mulheres devem evitar uma gestação. É mais prudente esclarecer para as mulheres os riscos de adquirir a doença, a real vontade de engravidar e se há possibilidade de postergar a gestação. Alem de informar as medidas preventivas a serem adotadas.